Não há como promover um revisionismo histórico desse nefasto acontecimento. É incontestável que foi um período marcado por regime de restrições aos direitos fundamentais e violenta repressão. Dissidentes políticos foram mortos ou desapareceram propositadamente. Milhares de pessoas foram presas arbitrariamente e muitas delas submetidas a torturas. A liberdade trocada por censura.
É inaceitável que uma sociedade baseada no estado de direito festeje uma data que trouxe tanto sofrimento ao país. Foram praticados crimes que não poderão ficar esquecidos, nem impunes, para que não sejam repetidos. Estivemos próximos de que isto pudesse voltar a acontecer. A vontade majoritária do povo brasileiro, na eleição de 2022, evitou essa ocorrência danosa para a nossa história.
Que essa fatídica data sirva para que possamos fazer uma reflexão sobre o legado autoritário que nos deixou. Existe vasto material bibliográfico que demonstra por fatos e documentos, que, ao contrário do que propagavam os promotores da ruptura democrática, não foi uma “Revolução”, e sim um “Golpe civil-militar”, que durou por mais de duas décadas. Então, não se justifica celebrar o “31 de Março” como uma data histórica a ser reconhecida como positiva para a historiografia brasileira.
Ainda bem que essas comemorações, cada vez mais, se distanciam do meio civil, e nem deveriam ocorrer nos quartéis. No governo passado, houve a intenção de retomar o significado revolucionário do golpe. Porém a revelação das verdades funestas do tempo em que fomos governados pelos militares ditadores, não mais permite que essa consideração seja aceita pela sociedade brasileira. Esses festejos não têm mais qualquer impacto popular ou político significativamente benéfico, a não ser para alguns ideólogos da extrema direita, saudosistas da ditadura, que insistem em consolidá-la como data a ser incluída no calendário cívico nacional.
Não faz mais o menor sentido permanecer com essa disputa, alimentada por uma polarização político-ideológica. Ninguém pode enfrentar a realidade definida pela História. Não houve a “Revolução de 31 de Março”, e sim o “Golpe Civil-Militar de 1º. de Abril”, que não pode ser naturalizado, nem esquecido, para que não voltemos a correr o risco de vê-lo repetido. E tem mais, sem anistia para os que intentam contra a democracia. Ivan Proença que foi preso pela ditadura, diz que “um ditado camponês do leste europeu afirma: se você poupar o lobo, estará sacrificando as ovelhas”. A terrível efeméride deve ser rememorada, nunca comemorada.
Rui Leitão