O sentido pejorativo da palavra “golpista” faz com que seus promotores não se vejam assim, porque defendem o entendimento de que a violação da ordem democrática se estabelece como uma necessidade e por isso preferem ser chamados de “revolucionários”. Têm a compreensão de que contam com o apoio de setores da sociedade, incluindo o militar. Tomemos como exemplo o “golpe de 1964”, que se auto-afirmou como uma “revolução”.
A história republicana brasileira é repleta de golpes, quase sempre, com a participação política das forças armadas, em alguns casos contando com apoio de instituições sociais na forma de protestos, na intenção de promover desgastes a governos legitimamente eleitos, em geral liderados por integrantes das elites dominantes.
Mas já tivemos também o golpismo disfarçado de democracia. E é o que se tem verificado nos anos mais recentes, através do impeachment da presidente Dilma e da eleição de 2018, quando prenderam ilegalmente o candidato que liderava as pesquisas, para que fosse permitida a vitória do candidato da extrema direita, impondo, então, um jogo de cartas marcadas.
O espírito golpista permaneceu por quatro anos na tentativa de impedir novamente a eleição de um presidente com características progressistas. Numa afronta direta ao Estado Democrático de Direito, insistentemente o governo que se instalou em 2019 procurou deslegitimar e descredibilizar as instituições brasileiras. A democracia foi usada com o objetivo de destrui-la, fazendo a apologia da ditadura e dos seus métodos repressivos, chegando ao cúmulo de se prestar homenagem pública a um torturador. O processo eleitoral foi atacado permanentemente, buscando colocar em dúvida a confiança nas urnas eletrônicas, as mesmas que ofereceram o resultado que lhes deram a oportunidade de alcançar o poder em 2018 e em 2022 formar uma bancada da direita nas casas legislativas.
O governo, quando se viu derrotado pelo voto popular, partiu para a segunda fase do movimento golpista, contestando o resultado eleitoral. As forças democráticas passaram a ser intimidadas, procurando criar uma situação de ingovernabilidade para o presidente eleito. Impulsos autoritários estimularam os discursos de ódio.
Ao longo da história o que vimos foram os golpes de Estado que variavam conforme seus atores, seus métodos e justificativas. Na contemporaneidade eles se efetivam contra processos e projetos de mudança sócio-econômica propostos por adversários políticos e ideológicos.
Os atos terroristas de 8 de Janeiro, em Brasília, quando as sedes dos Três Poderes foram invadidos por vândalos golpistas, fizeram com que se despertasse um sinal de alerta de que a nossa democracia continua vivendo em constante ameaça. A resposta imediata das instituições democráticas, felizmente, conseguiu inviabilizar o golpe idealizado. A democracia sobreviveu. Mas precisamos continuar alertas para que o 8 de janeiro, nunca mais se repita.
Rui Leitão