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GOLBERY: “CRIAMOS UM MONSTRO”

Por Rui Leitão

18/07/2024 às 04h48 Atualizada em 19/07/2024 às 02h57
Por: Redação
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GOLBERY: “CRIAMOS UM MONSTRO”

O SNI – Serviço Nacional de Inteligência foi criado pela lei nº 4.341 em 13 de junho de 1964 com o objetivo de supervisionar e coordenar as atividades de informações e contrainformações no Brasil e exterior. Seu idealizador e primeiro chefe, cargo que ocupou até março de 1967, o general Golbery do Couto e Silva, afirmou anos mais tarde, “criamos um monstro”. Durante todo o tempo em que o país viveu sob o regime de exceção instalado após o golpe de 64, o SNI atuou como um órgão de espionagem. Para que se tenha ideia da sua importância, dois dos seus chefes ocuparam a Presidência da República: Garrastazu Médici e João Batista Figueiredo.
 
 Tinha como foco principal o monitoramento de inteligência voltado para os inimigos políticos, aqueles que eram considerados “subversivos” ou “comunistas”. Na agência central, em Brasília, eram coletadas, processadas e catalogadas as informações obtidas através de grampos telefônicos e censura postal. Relatório elaborado por especialistas do Arquivo Nacional em 2008 aponta que mais de 300 mil brasileiros foram fichados pelo SNI durante a ditadura, muitos dos quais presos, torturados e assassinados. Agentes do SNI monitoravam as propagações de ideologias de esquerda nas universidades, empresas e repartições públicas, igrejas, escolas e sindicatos, além de vigiarem as atividades financeiras dos bancos e empresas privadas. O Arquivo Nacional mostra mais de 2.250 documentos do SNI com menções à Assembleia Constituinte, procurando inf luenciar na elaboração da nova Carta Magna, além de críticas ao então presidente José Sarney, o primeiro civil a ocupar o cargo após duas décadas de governo militar.
 
Sua extinção se deu pelo presidente Fernando Collor, logo após sua eleição, substituindo-o pelo Departamento de Inteligência da Secretaria de Assuntos Estratégicos (DI/SAE) da Presidência da República. No governo de Itamar Franco, o Departamento foi elevado à condição de Subsecretaria de Inteligência (SSI). Em 1999, o governo Fernando Henrique Cardoso criou a ABIN – Agência Brasileira de Investigação. Porém nunca deixou de ser um órgão influenciado pela Doutrina de Segurança Nacional da ditadura. O seu passado tenebroso tem se mantido no serviço de inteligência brasileiro. É uma herança da ditadura que não conseguimos apagar.
 
Mesmo com a redemocratização, o governo civil que sucedeu os militares encontrou dificuldades para se adequar aos parâmetros do novo regime, mantendo suas atividades de arapongagem. Por isso é natural o questionamento se há razões para a existência de um órgão no modelo do SNI no Estado Democrático de Direito, considerando que suas atividades estimulam violações do direito individual e a prática de atos abusivos. Governos continuam utilizando sua estrutura para monitorar opositores e até aliados. Há indícios de que no governo passado funcionou o que passaram a chamar de ABIN PARALELA, que está sob investigação da Polícia Federal.
 
A historiadora Priscila Brandão, autora do livro SNI e Abin: “uma leitura dos serviços secretos brasileiros ao longo do século XX”, registra que, após sua criação, o órgão se expandiu rapidamente, tornando-se uma rede altamente capilarizada e autônoma de arapongagem. “O SNI vai, igual a um polvo, se espalhando pelo Estado. Onde ele acha que precisa, ele cria uma agência nova”, ressalta a historiadora. Esse poderoso serviço secreto armazenou informações sobre parlamentares, estudantes, religiosos, intelectuais e líderes sindicais. Sua imagem, sem dúvida alguma, nunca deixou de ser a de um “entulho autoritário”.
 
Rui Leitão

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Rui Leitão
Sobre o blog/coluna
Nascido em Patos PB. Escritor e historiador. Sócio efetivo da Academia Paraibana de Letras, do Instituto histórico e geográfico paraibano e da Academia Cajazeirense de Artes e Letras
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