O regime autoritário vigente no país desde 1964, ainda que próximo do seu fim, continuava promovendo repressão, prisões políticas e intervenção nos sindicatos. Foi quando o Brasil tomou conhecimento da existência de um torneiro mecânico de origem nordestina, que se tornaria, anos depois, presidente da República, eleito para o exercício de três mandatos.
Por volta das 6h30 do dia 19 de abril, oito agentes armados, chegaram à residência de Luis Inácio da Silva, no bairro de Ferrazópolis, em São Bernardo. com ordem de prendê-lo, enquadrando-o na Lei de Segurança Nacional por promover greve e incitar publicamente a “subversão da ordem político-social”. Junto com ele outros 10 dirigentes sindicais foram igualmente presos. Frei Betto e Geraldinho haviam se mudado para a casa de Marisa e Lula no dia 15, logo após o tribunal decretar a ilegalidade da greve. Os dois correram para o telefone a fim de denunciar imediatamente a detenção de Lula, comunicando à Igreja, Legislativo, organizações de Direitos Humanos, advogados e jornalistas. Entendiam que a divulgação pela imprensa seria uma arma para garantir a integridade física dos presos e fazer com que a Secretaria de Segurança Pública declarasse oficialmente o local para onde estavam sendo conduzidos.
O cardeal Dom Paulo Evaristo Arms, arcebispo de São Paulo, ocupou microfones de emissoras de rádio para comentar a prisão dos líderes metalúrgicos, classificando-a de ilegal e criminosa. O clérigo já vinha se destacando pela forma veemente e corajosa com que denunciava as violações de direitos humanos e arbitrariedades cometidas pelo regime, oferecendo proteção aos presos políticos e denunciando a tortura. Dois dias após a prisão, 5 mil pessoas aglomeraram-se na Praça Da Sé, em São Paulo, para participar de um ato litúrgico celebrado pelo cardeal, em solidariedade aos metalúrgicos em greve e os sindicalistas presos. A esposa de Lula, Marisa Letícia, subiu ao altar representando o marido.
Na prisão, Lula recebeu tratamento respeitoso. Romeu Tuma, então chefe do Dops, permitia que ele passasse o dia todo em sua sala, onde lia jornais e até assistir o jogo do seu time de coração, o Corinthias. Recebeu visitas importantes, como as do senador Teotônio Vilela e de Almir Pazzianotto, advogado do sindicato. Numa madrugada, foi surpreendido com a chegada de dois emissários do general Golbery, ministro da Casa Civil, com o objetivo de negociar o fim da greve, não obtendo êxito nessa empreitada.
Nesse período em que esteve encarcerado, Lula foi avisado de que sua mãe, Dona Lindu, havia falecido, vitimada de um câncer no útero em estágio avançado. O delegado Tuma permitiu que ele fosse ao sepultamento no cemitério da Vila Paulicéia, acompanhado de dois policiais, sem algemas. Foi cercado por manifestantes que exigiam sua libertação. Um Lula tranquilo demoveu todos dessa imprudência e retornou à prisão sem a ocorrência de qualquer incidente grave. No dia 7 de maio os presos políticos anunciaram uma greve de fome que durou seis dias, mesmo que tenha se posicionado contra: "Sempre fui contra greve de fome, judiar do meu próprio corpo não é comigo, mas o pessoal decidiu".
Decorridos 31 dias da prisão, na noite do dia 20 de maio, Lula foi liberado por decisão do juiz Nelson da Silva Machado Magalhães, por considerar que não era mais necessário manter a prisão dos sindicalistas, entendendo que “a ordem pública não se achava mais perturbada”. Uma multidão esperava Lula em São Bernardo com fogos de artifiício para comemorar a soltura do líder. Ao conceder entrevista para o jornalista Ricardo Kotscho, em cima dos ombros dos companheiros, declarou: "Esse é um dos momentos mais felizes da minha vida, Se eu tiver de ser preso pelos mesmos motivos, por representar os anseios da minha categoria, eles podem me prender mais 500 vezes."
A partir de então, o líder sindical se transformava no político que o Brasil e o mundo hoje conhecem. Em depoimento à Comissão da Verdade chegou a afirmar: “Minha prisão politizou o movimento”.
Rui Leitão