“O problema com a mentira e o engodo é que só são eficientes se o mentiroso e o impostor têm uma clara ideia da verdade que estão tentando esconder.” Isso nos leva a compreender o que hoje chamamos de “fake news” já existia há séculos atrás. Com a chegada da era digital e das plataformas de comunicação esse comportamento de propagar informações inverídicas tornou-se muito comum, principalmente, quando se buscam objetivos políticos.
A democratização do acesso à informação abriu caminho para o paradoxo da desinformação e a manipulação em nome da liberdade de expressão. A mídia tradicional perdeu seu caráter original de comunicação de massa. As plataformas digitais propagam, com a utilização de filtros, conteúdos que, ao contrário de informar, desinformam. Mas tudo obedecendo a uma estratégia consequente da transformação da vida política numa espécie de mercado, onde os cidadãos comuns passam a pensar conforme o que lhes é comunicado através das bolhas ideológicas a que estão inseridos.
Alguns atores políticos, no aproveitamento dessa nova forma de comunicação, não se constrangem em agir com base na mentira e com flagrante má fé, arregimentando fiéis seguidores como se fizessem parte de um “rebanho”. Estimulam a afronta às instituições e atacam o Estado Democrático de Direito.
Quando são aplicadas medidas judiciais para combater a disseminação de informações falsas de modo consciente e propositado, em evidente proteção constitucional contra as mentiras, como vem fazendo o STF – Supremo Tribunal Federal no inquérito das fake news, reagem, seus promotores, com críticas alegando autoritarismo nas decisões, ignorando que estão trazendo graves consequências sobre a legitimidade democrática. É necessário que haja compatibilidade na liberdade dos cidadãos quando expressarem suas manifestações em debate público, sem sacrificar a veracidade dos fatos.
A liberdade de expressão não é ilimitada. Não é permissível que as redes sociais ou quaisquer outros veículos de comunicação desobedeçam ao princípio da neutralidade, produzindo perniciosas bolhas de pensamento. Esse comportamento exige aplicação judicial aos infratores. A internet e a mídia não são espaços sem lei. É crime atentar contra a honra e a imagem alheias. A punição legal não pode ser considerada violação à liberdade de expressão.
Basta ver que o próprio artigo 5º, inciso IV da Constituição Federal, defende a liberdade de manifestação, mas veda o anonimato, justamente para proteger a possibilidade de responsabilização em caso de violação à honra, ou outros direitos da esfera privada do cidadão, especialmente quando materializados por discursos de ódio. A justiça tem o dever de responder corretamente à função que lhe foi confiada pelo ordenamento jurídico, como guardiã maior da democracia.
Rui Leitão