Iran, Tabriz, Salar.
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Por Anne Silva
Desde 1979, quando irrompeu a Revolução Iraniana responsável por depor um chefe de Estado pró-Ocidente e alinhado aos interesses norte-americanos, os EUA têm lançado mão de "sanções de vários tipos" como "elementos-chave [de sua política] em relação ao governo iraniano", afirma um documento oficial do Congressional Research Service (CRS), que fornece análises das legislações do Congresso americano.
As sanções são empregadas para "deter, inibir e encorajar" mudanças no comportamento do regime iraniano, e têm afetado a economia do país à medida que ele "permanece uma ameaça" aos interesses norte-americanos na região e "àqueles de aliados, inclusive de Israel", prossegue o documento.
Assim como a Rússia, que tem sofrido com um pacote de sanções mais significativo por parte dos EUA desde 2022, e a China, cujo setor de tecnologia tem sido altamente cerceado (especialmente na indústria de veículos elétricos e semicondutores), o Irã tem buscado alternativas para fugir do controle financeiro do regime dolarizado na economia internacional.
O Banco Central do Irã planeja, para isso, introduzir sua própria moeda digital (CBDC) em breve, de acordo com um anúncio feito durante a 11ª Conferência Anual sobre Sistemas Bancários e de Pagamento Modernos.
O "Rial Digital" é parte de um projeto piloto do Irã que se iniciou ainda em 2023, e deve funcionar como um método de pagamento alternativo ao dinheiro “comum” e aos cartões bancários. Ao contrário dos meios de pagamento tradicionais, a versão digital da moeda iraniana não requer liquidação interbancária — isto é, não precisa de intermediação entre diferentes bancos ao ser transferido do comprador ao pagador.
Como estaria diretamente vinculado ao Banco Central, além disso, ela eliminaria a necessidade dos bancos comerciais. Isso significa que a introdução da moeda digital poderia "gerenciar os riscos causados pela disseminação do dinheiro privado", além de aumentar a resiliência da estrutura de pagamentos do país, afirmou o Banco Central Iraniano (CBI).
Mais de cem países já têm planos de adotar suas próprias moedas digitais em 2024. Em agosto de 2023, o Banco Central do Brasil anunciou o Drex, a versão digital do Real, que pode ser usado inclusive na compra e venda de títulos públicos.
Durante o anúncio de lançamento da nova moeda iraniana, Mohammad Reza Farzin, presidente do Banco Central do Irã, ainda evidenciou a importância de métodos alternativos de transações para superar as dificuldades trazidas pelas sanções norte-americanas.
Uma das medidas implementadas para esse propósito foi o sistema ACU-MIR, formado pela Asian Clearing Union, organização asiática que simplifica a compensação de pagamentos entre seus membros, e o MIR, o sistema de pagamentos russo criado para processar suas transações multilaterais internamente. O sistema foi projetado para servir como meio para a cooperação multilateral na Ásia (entre países como Índia, Irã, Bangladesh, Paquistão e Sri Lanka) em alternativa ao SWIFT, criado em 1973 sob o regime do dólar.
A substituição do SWIFT também "fortaleceu os laços entre os Brics", disse Farzin.
O bloco das economias emergentes já tem no horizonte a perspectiva de integrar os membros ao seu próprio meio de pagamentos; a intenção de desdolarizar as economias do Brics foi debatida durante os encontros da Cúpula do grupo, ocorridos em outubro de 2024, em Kazan, na Rússia. Farzin disse que especialmente a Rússia e a China têm guiado o processo.
"Estamos trabalhando no desenvolvimento de um sistema de pagamentos independente, não sujeito a pressão política, abusos e interferência de sanções externas", disse Putin durante o Fórum Mundial de Economia Internacional.
O bloco também teria considerado a criação de uma criptomoeda, uma nova unidade de conta apoiada em tecnologia blockchain, como o Bitcoin, para integrar seus mercados de maneira ainda mais desvinculada do dólar.
O Irã e a Rússia, ademais, já têm um sistema integrado de transações, que une a rede de pagamentos Shetab, do Irã, ao sistema MIR russo, conectando bancos de ambos os países e fazendo com que "cartões bancários iranianos possam ser usados na Rússia" para, por exemplo, sacar dinheiro de um caixa eletrônico (ATM), conforme noticiou o Al Mayadin.
Essa iniciativa de integração quer se estender, agora, aos países que mantêm relações próximas com o Irã, como o Iraque, o Afeganistão e a Turquia.
“Os líderes iranianos procuram mitigar o impacto das sanções a partir do desenvolvimento do que o Líder Supremo Ali Khamenei chamou de ‘economia de resistência’”, afirma o documento do Congresso norte-americano a respeito da política sistemática de sanções ao Irã — dita eficaz pelos oficiais.
“Khamenei afirmou que o Irã precisa reduzir sua dependência de atores externos de ‘construir a economia de dentro’”. Os laços do país com o Sul Global também são avaliados pelo documento, à medida que as sanções sejam capazes de "estimular" o Irã a buscar alianças com potências não-alinhadas, como a China, e sua vizinha, a Rússia.
A implementação de cada vez mais instrumentos multilaterais de cooperação dissociados do dólar tem provado isso verdadeiro.